Última alteração: 2018-06-07
Resumo
A pesquisa pretende contribuir para a discussão da relação entre a crise do capital e a produção do espaço, debate atualmente presente na Geografia e em outros ramos do conhecimento. Nossa reflexão deve se ater à obra de David Harvey (2005,2011,2012,2013) e na análise de uma possível nova fronteira imobiliária de acumulação à nível nacional, que teria sido constituída no Brasil, mormente na primeira década dos anos 2000. Trataremos aqui da sua fração habitacional impulsionada, por um lado, através dos diversos instrumentos de captação no mercado financeiro e, de outro, pelas políticas públicas habitacionais, com destaque para o Programa Minha Casa, Minha Vida. No âmbito da Geografia, muitas pesquisas têm abordado os projetos de reestruturação/requalificação dos centros urbanos e o crescimento das cidades via periferização/suburbanização, associando-os a um processo mais amplo de financeirização do setor imobiliário. Para Harvey, esse fenômeno revela que o espaço geográfico além de indissociável das contradições da sociedade moderna, desempenha uma função imprescindível para estabilizar o capitalismo. As crises imanentes podem gerar uma onda trágica de desvalorização e destruição ou, ao invés disso, serem resolvidas via “ajustes espaciais”, produzindo e configurando novos espaços de acumulação. O deslocamento constante do capital na estrutura espacial de desenvolvimento desigual engendraria potencialmente uma solução, ainda que temporária, às contradições sociais, que do contrário seriam disruptivas da ordem social. O crescimento sem precedentes do mercado habitacional brasileiro na primeira década dos anos 2000, absorveu grande quantidade de capitas excedentes a nível mundial; o país estava entre os mercados imobiliários mais lucrativos/promissores do mundo. As enormes cifras investidas em ações, fundos de investimentos imobiliários, títulos de securitização, letras de crédito, debêntures, entre outros, para a construção habitacional, encontraram uma florescente demanda; as políticas públicas de crédito integraram milhões de brasileiros no consumo da moradia, inclusive as parcelas mais pobres da população até então excluídas do circuito imobiliário e que formavam o principal do chamado “déficit habitacional”. Observou-se que o pujante crescimento significou a expansão da segregação e das desigualdades sócioespaciais pela extensão das periferias urbanas. As habitações de baixa qualidade nos limites do tecido urbano foram produzidas em massa para garantir a lucratividade e as metas das companhias de capital aberto, projetadas para atrair os investidores do mercado financeiro. Muitas famílias foram expulsas de antigas ocupações irregulares e obrigadas a assumirem um conjunto de dívidas, que incluíam a “casa própria” e outras prestações e contas. O propalado “boom” da construção civil redundou em um enorme endividamento de muitas empresas, estouro dos custos e diversos outros problemas, sem mencionar algumas fraudes contábeis, fato que revela a autonomização das metas do setor financeiro frente à capacidade das companhias. A construção das habitações reiteraram velhos problemas das periferias, aos quais foram somados novos constrangimentos pelo endividamento. Questionamos, por fim, se tais fenômenos constituiriam uma nova fronteira de acumulação na forma de “ajuste espacial” ou apontariam para uma crise estrutural da acumulação do capital.