Última alteração: 2018-06-12
Resumo
Resumo: Ao longo das últimas décadas, a reconfiguração espacial dos espaços urbanos e a prioridade dada ao investimento rodoviário têm contribuído para o intensificar da pressão sobre os agregados familiares para a aquisição de um veículo próprio. A posse ou o acesso a um automóvel possibilita de facto um alargamento dos espaços de vida, a multiplicação das actividades sociais e a diversificação dos recursos urbanos ao dispor dos indivíduos. Coloca no entanto, se resultar de uma aquisição forçada (Currie, 2007), grandes dificuldades presentes e futuras às famílias mais vulneráveis. Por um lado, gera uma agenda diária mais complexa e difícil de manter, e aumenta a taxa de esforço relacionada com a mobilidade. Por outro, reforça a fragilidade dos indivíduos perante a ameaça de uma redução significativa ou da interrupção definitiva da condução, que o envelhecimento ou outros eventos trazem. A não realização ou redução da frequência de deslocações (Marottoli et al., 2000), a dependência de terceiros (Hakamies-Blomqvist et al., 2003) são algumas das consequências mais óbvias. Os efeitos da interrupção da condução multiplicam-se na saúde física e mental (Edwards et al, 2009; Chihuri et al., 2016), no sentimento de autonomia e inclusão na comunidade (Neal et al., 2008) e na qualidade de vida dos indivíduos (Ann et al., 2015). Esta tendência levanta múltiplas questões no cruzamento do planeamento e da mobilidade urbana, da saúde e da inclusão social.
Esta proposta de comunicação enquadra-se no projecto “Inclusive Accessibility Planning: from Transport Systems and Service Provision to Social Inclusion” (financiamento FCT, IF/01291/2014). Serão apresentados os resultados preliminares de um inquérito conduzido num universo composto por cerca de 500 indivíduos, com idade igual ou superior a 40 anos e residentes em bairros socialmente vulneráveis diversamente localizados na Área Metropolitana de Lisboa. O inquérito foi concebido de modo a relacionar os padrões de mobilidade (em particular a relação com o automóvel), o acesso a determinados serviços e a existência de suporte social e/ou familiar, com a percepção de qualidade de vida, de saúde e de bem-estar.
Com base em métodos de análise espacial e estatística multivariada, a análise irá diferenciar dois grupos de inquiridos: por um lado, os indivíduos condutores; por outro, os não-condutores (que nunca conduziram ou deixaram de conduzir). As motivações de uns e de outros, os efeitos percepcionados (isolamento, dependência de outros) e os mecanismos de solução encontrados (transferência modal, redução do número de actividades realizadas) serão analisados.
Ao constituir a primeira etapa da exploração dos dados de um inquérito original, esta comunicação permitirá esboçar novas pistas de reflexão, necessárias para o reforço do planeamento de sistemas de transporte mais inclusivos e adaptados às necessidades actuais e futuras dos indivíduos, especialmente os socialmente mais vulneráveis.